terça-feira, 9 de novembro de 2010

7.ª Maratona do Porto


9Horas da manhã de Sábado e 2 autocarros a transbordar coragem, esperança, sonhos e aventura partiriam a caminho daquela que este ano se consagrou, indiscutivelmente, como a melhor maratona do País, a Maratona do Porto.

Depois da viagem sem problemas, o Palácio de Cristal e a feira da Maratona, acolhiam-nos. Levantamento dos Dorsais e aquela que julgo ter sido a única falha da organização, acontece. Um erro de listagens colocava dois companheiros e amigos temporariamente fora da corrida. Mas pior que isso só a primeira abordagem errada e grosseira por parte de um elemento ligado à organização, mais preocupado em fazer valer os créditos do que resolver o problema do atleta, afastava o amigo António Almeida da corrida, por decisão própria mas honrada. Chegados ao Hotel, e graças à excelente organização da incansável Ana Pereira, tínhamos ainda umas quantas horas para descansar antes do jantar. Para muitos a véspera da prova deve ser passada de pernas esticadas num qualquer sofá para não gastar energia, mas para mim nada melhor que um jantar na Invicta com um casal amigo para sobrecarregar as baterias de boa disposição e energia positiva. Foi um prazer jantar com a Joana e o Hugo e sentir que também eles acreditavam no meu sucesso nesta maratona, a eles o meu muito obrigado pela simpatia e amizade, e faço votos que o futuro lhes seja risonho, muito risonho.

6h30 da manhã de domingo e era hora do pequeno-almoço dos campeões. Que sorte tiveram os Quenianos e outras estrelas de tomar o pequeno-almoço lado a lado com os TANDUR, como os invejo! Depois deste valente repasto era tempo de equipar, mandar os beijinhos telefónicos à família e arrancar para o autocarro VIP que nos levaria à partida. Chegar cedo à partida dá tempo para tudo, beber um cafezito e ver os amigos e companheiros da blogosfera, o Luís Parro e a esposa, o Luís Mota e a família, Rui Pena, João Paixão, Carlos Melo, Vasco, Brito, o Joaquim Adelino o Fernando Andrade e tantos outros que partilham o gosto pela corrida.

Faltavam dez minutos apenas, quando ouvi ao telemóvel o meu filho Tiago desejar-me boa sorte. Moral em alta. Mais um toque e agora um MMS da Família numa foto sorridente. Fiquei a transbordar moral. Um abraço ao “primo” Vitor Veloso e vamos à nossa estreia na Maratona.
Os primeiros 10km´s voaram a serpentear pelas ruas do Porto até chegar à Foz, com a sua vista deslumbrante. Nesta altura eu e o Vitor alcançamos o VIP Fernando Andrade. Sabia que não estava preparado para ir com o Vitor até ao fim, ele está numa grande forma e eu com poucos km´s nas pernas para o acompanhar, decidi ficar com o Fernando Andrade, e em boa hora o fiz. Imaginem-se a correr a vossa primeira maratona, sabem que os treinos foram poucos, que não tem experiência a correr estas distâncias, e têm a sorte de ficar lado a lado com um atleta que leva quase 40 maratonas no currículo. É a pessoa certa para nos ensinar o B A BÁ da maratona e nos ajudar a concluir um sonho.

A presença do “Mestre” Fernando Andrade e a paisagem magnífica do Douro na sua chegada à foz, fizeram-me sentir um privilegiado aprendiz. É deslumbrante correr ali, absorvendo a
paisagem, vendo o rio correr com as suas águas cheias de vontade em chegar ao mar. Passar a ponte D. Luís e disfrutar de cada passada, naquela calçada cheia de histórias de outros tempos.
Ao chegar à Afurada a comitiva de apoio aos Tandur, reforçada pelo António Almeida, ali estava para nos saudar. Eu e o Fernando Andrade esboçamos o sorriso e lá ficamos na foto da Isabel Almeida. O clã Veloso também teve direito ao adeus e até já, pois ainda tínhamos de voltar. Passámos a meia maratona com 1h38m, demasiado rápido. O Fernando bem disse nesta altura, “veremos senão vamos pagar a ousadia mais lá para o fim”, pois o objectivo era passar em 1h45m.Já depois do primeiro retorno e de volta ao Porto, voltamos a ser apanhados pela objectiva da Isabel no meio de mais uns rápidos acenos e palavras de força.

Segunda passagem na ponte D. Luís e viramos para o freixo onde estava o último retorno perto dos 29km´s. A paisagem continuava lá, magnífica e deslumbrante. Nesta altura cruzava o Vitor do outro lado, rápido e fresco como uma alface. 30km´s e abastecimento, faltavam doze para o sonho. Em sentido contrário vinha o Adelino que saudámos efusivamente. Depois dos 32 km´s, sentia-me bem e após uma breve troca de palavras com o Fernando, aconselha-me a ir com uma senhora carregada de maratonas de nome Margarida Pinto. Corria agora embalado na letra da canção de Rui Veloso, da ribeira até à foz. Só que como não sabia o resto da letra também não consegui antever o terrível vento forte e frontal a partir dos 37km´s que literalmente parecia uma parede, lembrei-me nesta altura daquelas muitas histórias que se contam sobre a parede dos 30km´s. No Porto a parede não é aos 30 mas sim aos 37. Já perto dos 39kms e depois de já não conseguir acompanhar o ritmo da Margarida, que em muito me incentivou para que continuasse, uma primeira cãibra. Respirei fundo e pensei, “caramba só faltam 3 km´s, aguenta-te”. Ainda não tinha acabado o raciocínio e uma segunda cãibra obriga-me a coxear, pensei rápido, “não pares continua”, mordi o lábio e continuei, mais 100 metros. À terceira cãibra foi de vez, parei. Tentei alongar mas não conseguia, sentei-me. Estiquei as pernas e rapidamente um elemento da organização me perguntou se estava bem, respondi-lhe que estava melhor se tivesse trazido dinheiro para o táxi, mas enfim.

Fechei os olhos e pensei no que já tinha feito, na minha mulher e nos meus dois filhos, ansiava nesta altura por uma cara conhecida. Olhei um pouco para trás e vinha lá o Fernando Andrade, respirei fundo e levantei-me lentamente, erguendo a carcaça cheia de mossas mas com a convicção que podia ir com ele. Surpreso por me ver ali, logo me dirigiu as palavras que me levariam à meta: “Filipe, agora nem seja de gatas, mas isto é para acabar”. Corri novamente ao lado do Fernando mais 500 metros, mas não dava. E voltei a parar. A família não me saía do pensamento, as palavras do Fernando ecoavam-me na cabeça. Bebi um pouco de água, sem saber como ou porquê levantei-me e corri. Vejo a placa dos 40km´s e mais uma cãibra, “aguenta-te”. Vejo o João Paixão e saúdo-o muito vagamente. Mais 200 metros e outra cãibra, “aguenta-te à bronca”. Começava a subida até à meta e todo torcido lá segui. 41km´s, montes de gente na berma da estrada saudava e incentivava aqueles loucos desconhecidos gritando os nomes que liam nos dorsais. A 400 metros da meta nova cãibra, desta feita mais violenta. Parei, sentei-me e num gesto rápido e sincronizado alonguei os músculos com toda a força, sorri. Um desconhecido aborda-me e lendo o meu nome no dorsal diz-me que a meta é já a li, levantei a cabeça e vejo a medalha que trazia ao pescoço por ter terminado a prova. Olhei para ele e respondi-lhe que se davam uma chapa daquelas no fim tinha me despachar para que não acabassem. Levantei-me novamente e corri até ao fim, sem cãibras, mas com um sorriso nos lábios para ficar bem no photo finish.

3h40m33s, SOU MARATONISTA. Recebo a medalha, o saco e o telemóvel toca, pensei, é a minha mulher. Errado! Era o Vitor Veloso, com uma grande energia a dizer para correr que o autocarro para o hotel ia partir.” És louco companheiro correr agora, nem ao pau com os ursos”. Mas lá fomos a festejar como duas crianças em direcção ao autocarro por termos concluído uma maratona. O autocarro começa a andar e diz novamente o Vitor, “saltamos a grade porque senão não o apanhamos”. Saltar!? A grade!? Os maratonistas não saltam e eu vou à volta que não aguento as pernas.

Resumindo, agradeço a todos aqueles que acreditaram no meu sonho e me ajudaram a alcança-lo, aos Tandur Vitor Veloso e António Almeida e respectivas famílias, ao acidental padrinho da minha primeira maratona Fernando Andrade, ao amigo Joaquim Adelino e claro à mulher da minha vida e os meus maravilhosos filhos que sofreram pela minha ausência na busca de um sonho.